Impactos da neurose nas relações conjugais à luz do filme A difícil arte de amar

dvd_8331Meu objetivo neste texto é demonstrar como a presença de neurose em cada um dos membros de um casal pode impactar negativamente a relação conjugal e, muitas vezes, inviabilizá-la. Para tanto utilizarei como estímulo para refletir sobre o tema o filme “A difícil arte de amar”, lançado em 1986 sob a direção do norte-americano Mike Nichols e estrelado por Meryl Streep e Jack Nicholson.

A história, aparentemente banal, começa com Rachel (Meryl Streep) flertando em um casamento com Mark (Jack Nicholson). Ela se apresenta como uma mulher independente, cabelos curtos, roupa elegante e sóbria. Trabalha como escritora de matérias culinárias na agitada cidade de Nova York. Durante a cerimônia, toma a dianteira no flerte, olha para ele, visivelmente mais velho que ela, pelo espelho da maquiagem. Ele, galante e com histórico de mulherengo (o solteiro mais famoso da cidade), devolve o olhar.

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Resistências à terapia em tempos de crise nacional

downloadÉ sabido de todos que o Brasil vive um período de crise política e financeira, consequência de um pensamento mágico que pairou entre os governantes e a população na última década de que a crise mundial não iria chegar aqui (“era só uma marolinha”) e de que, por isso, podia-se gastar muito mais do que se arrecadava.

Diante da constatação de que há uma crise instalada, meu objetivo neste post é refletir sobre como, em momentos de crise (individual e nacional), as pulsões destrutivas tendem a predominar no psiquismo levando o indivíduo a entregar-se sem tanta resistência ao princípio de prazer.

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Lançamento do livro Eu, Clarice

livro ana laura moraes martinezÉ com imenso prazer que compartilho com os meus leitores o lançamento do meu primeiro romance Eu, Clarice, publicado no formato de ebook.

Na romance o leitor poderá acompanhar de perto como a pequena protagonista, acompanhada desde o nascimento até a morte, entrega-se com paixão frente à árdua tarefa que sua mãe lhe delegou: encontrar a luz da verdade.

Em uma narrativa biográfica que acompanha cada momento da vida de Clarice, o leitor pode conhecer, na intimidade dos pensamentos da protagonista, como ela vai costurando as tramas de sua história pessoal bastante trágica.

Nesta busca incessante, a pequena Clarice dá mostras do seu heroísmo na medida em que encontra possibilidade de transformar os escombros de sua realidade familiar trágica em algo com que ela possa sonhar. Nesse sentido, Clarice pode ser cada um de nós com seus dramas internos e suas tragédias pessoais.

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A angústia de envelhecer e o ódio do jovem com a velhice.

downloadCaro leitor, façamos um exercício imaginativo. Imagine esta cena:

Você está bem velhinho, talvez com 80 ou 90 anos de idade. Todo o seu corpo dói. Ele não responde mais aos seus comandos cerebrais. Você quer que sua perna se movimente rapidamente, mas ela é mais lenta que uma tartaruga. Sua visão é opaca e borrada. Não pode mais enxergar a beleza das flores ou o rosto do seu netinho com nitidez. A única memória que possui da beleza da vida são aquelas que lhe restaram dentro da cabeça, já bastante desmemoriada. Além de tudo, você está apavorado com a proximidade da morte: o maior temor de todos os seres humanos viventes. Ela está para chegar, e o mais terrível é que você não tem a menor ideia de quando ela virá: se hoje, amanhã ou no ano que vem. O seu estado de incerteza é absoluto. Sua audição está péssima. Sente-se o tempo todo mergulhado em uma piscina funda. Não pode mais ouvir o barulho da chuva ou o riso do seu neto ou o canto dos passarinhos, que sempre alegram o coração humano, mesmo daqueles mais amargurados com a vida.

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Pelo direito de sentir medo.

imagesEsta semana foi noticiada uma reportagem que eu achei bastante curiosa.

Colônias de férias de crianças estão sendo proibidas, pelos pais, de contarem estórias de medo. O argumento dado por eles, segundo a reportagem, é que este tipo de estória pode traumatizar ou amedrontar as crianças desnecessariamente. O curioso é que, na matéria, o discurso dos pais era corroborado por um dos donos da colônia, que disse:

– É um período de férias, de curtição. Então, a gente só deve falar de “coisas alto-astral, só coisas pra cima” (sic).

O que podemos pensar sobre isso?

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A morte é um borrão na natureza.

downloadEm “Os trabalhadores do mar”, de Vitor Hugo, diz o narrador sobre o desespero de Gilliatt, diante do risco de sua própria morte:

            O homem diante da noite reconhece-se incompleto. O céu negro é o homem cego. Com a noite o homem abate-se, ajoelha-se, arrasta-se para um buraco ou procura asas. Quase sempre quer fugir a essa presença informe do desconhecido. Pergunta: O que é; treme, curva-se, ignora; às vezes, quer ir lá. Todo o número é zero diante do infinito. Dessa contemplação solta-se um fenômeno sublime: o crescimento da alma pelo assombro. Mas, este prodígio universal não se realiza sem atritos e os atritos é o que chamamos de Mal. O Mal desconcerta a vida, que é uma lógica. Faz devorar a mosca pelo pássaro e o planeta pelo cometa. O Mal é um borrão na natureza.

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Maternidade: escolha ou destino?

imagesNa semana passada vivi uma experiência desagradabilíssima, que servirá como estímulo para minhas reflexões neste texto. Vamos à cena:

Eu e um médico ginecologista, bastante avançado em idade. Tratava-se de uma consulta de rotina. Depois dos procedimentos rotineiros, o médico me indaga, com olhar inquisidor:

– Você não vai ter filhos?

– Por enquanto não. Respondo prontamente.

Silêncio sepulcral…

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O tempo é um monstro que engole tudo.

imagem sobre tempo - salvador daliO tempo é um monstro que engole tudo. Esse foi o pensamento que me ocorreu hoje, logo pela manhã, sobre o qual me coloquei a pensar seriamente. Por que esta frase, categórica, enfática, povoa minha mente justo nesta terça-feira, dia 02 de dezembro, às sete da manhã? Penso na proximidade do final de ano. Data ingrata, sinistra, que sempre mobiliza angústias intensas, atávicas. O ser humano transita entre dois pólos, a vida toda. Busca estabilidade e busca mudança, transformação.

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Memórias-sonho de uma viagem rumo à natureza selvagem.

Acabo de fazer uma viagem linda com o meu marido. Juntos, trouxemos na bagagem, além de fotos e memórias, algumas aprendizagens valiosíssimas. Uma viagem, assim como qualquer nova experiência, quando contida pela mente daquele que a vivencia, enriquece e amplia o psiquismo. Dito de outro modo, quando uma experiência desconhecida pode ser processada e sonhada pela mente, há expansão mental que leva a novos desenvolvimentos e aprendizagens. Mas, quando o contato com o desconhecido é angustiante demais e, por isso, evacuado, nada se pode aprender de novo. Volta-se o mesmo que se foi.

Mas, vejamos o que eu pude sonhar (no sentido utilizado por Bion) nesta linda viagem.

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Mata-se uma criança – parte I

download (6)Neste texto partirei do estimulante livro “Mata-se uma criança” do psicanalista francês Serge Leclaire (1977), que acabo de ler, para desenvolver minhas próprias elaborações a respeito deste tema tão sinistro e fortemente evitado, mesmo entre os psicanalistas.

Leclaire parte da seguinte ideia: aceitamos com alguma tranquilidade a presença de desejos assassinos dirigidos ao pai e a mãe da criança edipiana. Mas, a fantasia de matar crianças, animada pela mente dos genitores, é algo, segundo ele, fortemente evitado e que causa repulsa.

Sustentando sua argumentação, cita que na tragédia Édipo Rei, de Sófocles, o personagem trágico Édipo só assassinou o pai e desposou a mãe porque a criança, que foi enviada pelo pai para morrer no monte Citerão, foi encontrada por um pastor. Para quem não conhece a tragédia, vamos a um breve resumo:

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