O que devo esperar ao final de uma psicanálise?

images (3)A discussão sobre os “resultados” esperados em uma psicanálise é bastante complexa (até mesmo inoportuna) e nos leva a algo ainda mais problemático que é a ideia de cura.

O modelo médico não tem problema algum com a ideia de cura. Um órgão ou sistema está doente e é função do médico visar a cura. Mas quando o que adoece é a mente e não o corpo, o que significa falarmos em cura?

Cura da mente existe?

Quando um paciente nos procura ele frequentemente quer ser curado e nos pergunta quanto tempo levaremos para curá-lo daquilo que ele sente e que pode descrever vagamente como “tristeza”, “ansiedade”, “vazio”, “tédio”, ou ainda como “algo que nem se sabe explicar”. Ou ele pode querer ser curado de um conjunto de sintomas bem específicos: uma fobia ou uma compulsão por sexo, por exemplo.

Diante deste pedido, o que responde o psicanalista?

Ele responde o mesmo que disse o filósofo ao caminhante na Fábula de Esopo: Quando este perguntou ao Filósofo quanto tempo duraria sua jornada, o Filósofo simplesmente respondeu ‘Caminha!’ e justificou sua resposta aparentemente inútil, com o pretexto de que precisava saber a amplitude do passo do caminhante antes de lhe poder dizer quanto tempo a viagem duraria.

Trazendo para a realidade do psicanalista, diante do pedido de cura do paciente, ele responderá: “Fale-me sobre você!” o que significa “Caminhe sem se preocupar com o resultado final” ou ainda “Esqueça as metas. Pensemos sobre você”.

Por que ele faz isso?

Ele faz isso porque ele sabe que a resposta que o paciente busca não está onde ele imagina estar, ou seja, no médico, mas dentro dele próprio. Só que o paciente não sabe disso. E às vezes, o que é pior, ele não quer saber de nada disso. Ele quer e não quer saber a verdade sobre si mesmo. Por isso adoece. Nietzsche dizia que a doença acontece quando “começamos, em algum ponto, tornar as coisas mais fáceis para nós”. Essa ideia do filósofo se aplica perfeitamente ao adoecimento mental.

Adoecemos psiquicamente porque queremos tornar as coisas mais fáceis para nós, por exemplo, evitando pensar em coisas que nos desagradam ou envergonham sobre nós ou não querendo assumir aquilo que verdadeiramente somos.

No fundo, então, o desejo de curar-se esconde quase sempre um desejo de não se confrontar com aquilo que se é. O problema é que não fugimos de nós mesmos.

Diante disso, o que esperar de uma psicanálise?

Listarei abaixo alguns dos percursos possíveis (mas sempre imprevisíveis) a que uma psicanálise pode nos levar:

  1. A constatação que a ideia de processo é mais compatível com o viver humano do que a noção de resultados
  2. Uma melhor aceitação de nossas limitações humanas, inclusive, da nossa finitude
  3. Uma maior tolerância com o Outro (o Outro em mim e o Outro no outro)
  4. Uma maior capacidade de sentir compaixão e gratidão pela vida e por nossos pais
  5. Uma maior capacidade de gozo (viver com paixão)
  6. Uma melhor aceitação do nosso desamparo fundante
  7. Uma maior aceitação das nossas responsabilidades para conosco e para com o semelhante
  8. Uma maior aceitação para o fato de que não há cura para o frenesi que é viver
  9. Uma maior aceitação da passagem do tempo

Por tudo isso que eu disse, a psicanálise pode ser considerada mais uma posição ética e filosófica do que uma forma de tratamento conforme o modelo médico (no qual a noção de cura é perfeitamente cabível). Por isso Freud chamava sua psicanálise de metapsicologia.

Se você desejar saber mais sobre o que é a psicanálise, leia o meu texto sobre a abordagem psicanalítica

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